Karl Marx
A determinação ontonegativa originária do valor
Ivan Cotrim reflete sobre um tema atualíssimo: a lei do valor. Durante algumas décadas, o tema parecia estar esquecido num mundo dividido pela polarização ideológica que se seguiu à Revolução Russa.
De um lado, o capitalismo moderno mantinha a lei do valor escondida através da imposição dos preços no mercado governado pelos monopólios. Publicitários mal informados se encarregaram de divulgar uma interesseira inverdade: o valor é dado pelas virtudes impalpáveis da grife e não pelo trabalho humano – afirmação que confundia preço com valor.
De outro lado, no socialismo real, a lei do valor e a produção mercantil eram vistas como realidades transitórias que a realização do comunismo progressivamente cancelaria. Acreditava-se que o valor havia deixado de ser o regulador espontâneo da atividade econômica, ao integrar-se no planejamento racional. A produção mercantil, contudo, continuava a todo vapor e só iria desaparecer com o pleno desenvolvimento das forças produtivas e o ingresso final no comunismo. Como se sabe, a persistência da produção mercantil envenenou as entranhas das sociedades pós-capitalistas, e o descompasso do valor em relação aos preços fixados pela burocracia estatal se encarregou de implodir uma economia a meio caminho entre capitalismo e socialismo. Após o fracasso dessa experiência, o retorno das teses sobre o “socialismo de mercado” apenas complementam a crença das relações mercantis como a forma universal e necessária de intercâmbio entre os homens.
Nas últimas décadas, a lei do valor fez o seu reingresso no debate contemporâneo nas teses sobre “capitalismo cognitivo”, “trabalho imaterial”, “sociedade da informação” etc. Diversos autores ligados ao que eufemisticamente se convencionou chamar de “pós-marxismo” afirmam que o valor não provém mais do trabalho, mas do conhecimento que se materializa nas patentes. Desse modo, saem de cena a indústria, a classe operária e as suas formas tradicionais de luta. O trabalho material dos homens perde relevância sob a regência do “paradigma da comunicação”.
Há algo de verdadeiro nessas teses: de fato, a ciência tende a se transformar na principal força produtiva, tal como Marx prognosticou nos Grundrisse. Mas, trata-se ainda de uma tendência restrita a alguns setores da produção. De qualquer modo, não faz sentido se apegar desesperadamente à lei do valor e, assim, gastar vela com mau defunto.
Esta é a lição que se deve tirar dos ensinamentos de Ivan Cotrim. A lei do valor não é somente um regulador neutro da transação econômica, uma simples medida, pois no momento da troca o que se manifesta é o trabalho abstrato e, com ele, a forma necessariamente alienada da sociabilidade na sociedade mercantil.
Por isso, Ivan Cotrim insiste em afirmar o caráter negativo do valor, sua exterioridade em relação à essencialidade humana. Falar em valor pressupõe sempre trabalho abstrato, alienação, estranhamento. Por essa razão, o autor procura fixar as diferenças entre Marx e a economia clássica, focando a atenção nos momentos iniciais da formação da ontologia marxiana. Unindo um sólido conhecimento com uma invejável competência discursiva, inicia o leitor na densa problemática do valor e de seu desagradável entorno, advertindo-nos contra os “seresteiros desavisados” que insistem em cantar o pretenso caráter universal dessa forma alienada de intercâmbio entre os homens.
Celso Frederico
Sobre o autor: Ivan Cotrim é graduado em Sociologia e Política pela Escola de Sociologia e Política de São Paulo, mestre em Ciência Política pela Unicamp e doutor em Ciências Sociais pela PUC-SP. É autor de vários artigos sobre política e economia publicados em revistas acadêmicas e jornais. Fez parte da direção da editora Ensaio.
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SUMÁRIO
Agradecimentos - 9
Introdução - 11
PARTE I
A Economia Política: essência natural do indivíduo e positividade do valor - 39
Capítulo 1
A “essência natural” do indivíduo - 39
Capítulo 2
Economia política clássica e positividade do valor - 121
PARTE II
A determinação ontonegativa originária do valor em Marx - 173
Capítulo 3
Os Cadernos de Paris - 175
Capítulo 4
A crítica da economia política nos Manuscritos Econômico-Filosóficos – 229
Capítulo 5
A economia política em Proudhon em A Miséria da Filosofia - 309
Capítulo 6
Trabalho assalariado e capital: o duplo caráter do trabalho – 309
Conclusão - 333
Bibliografia - 355