Joana Evangelista, de Vange Leonel
Escrita por Vange Leonel em 2006, Joana Evangelista é uma peça teatral poderosa e visionária que mergulha nos abismos da fé, da sexualidade, da maternidade e da repressão. Inspirando-se livremente na figura histórica de Joana d’Arc e transpondo-a para o Brasil contemporâneo, Vange dá corpo a uma nova Joana — médica, lésbica, transmasculina, abortista convicta e guiada pelas vozes de Santa Catarina de Alexandria e do Arcanjo Miguel.
Encenada pelo grupo Os Satyros, mas até hoje inédita em livro, a peça finalmente chega ao leitor graças à Alameda Editorial, revelando uma dramaturgia rara, híbrida e insubmissa. Entre a cela e o consultório, entre o delírio místico e a denúncia política, Joana Evangelista confronta o patriarcado, o sistema judiciário e a moral sexual com a lâmina de uma escrita afiada, feminista e herética. Neste palco de grades móveis e úteros insurgentes, Vange Leonel entrega uma heroína dois-em-um — mártir e santa, pecadora e médica, lésbica e transgressora — cuja dor e desejo anunciam um novo evangelho para os tempos sombrios.
Sobre a Autora:
Vange Leonel (1963–2014) foi cantora, compositora, escritora, dramaturga, poeta e militante feminista e lésbica. Ficou conhecida nacionalmente como vocalista da banda Nau e, depois, como autora do hit “Noite Preta”. Ao longo da vida, construiu uma obra múltipla e engajada, que inclui colunas na imprensa, contos, romances, ensaios, canções e peças de teatro. Em todas as suas criações, Vange desafiou as normas de gênero, denunciou as violências contra corpos dissidentes e reivindicou liberdade sexual, política e estética como
formas de existência e resistência.
PERSONAGENS
Joana Evangelista: 38 anos, médica especializada em ginecologia e obstetrícia.
Carlos Darwin: 50 e poucos anos, o novo chefe de polícia da delegacia.
Carcereiro: entre 20 e 40 anos, policial encarregado da carceragem.
Advogado: 40 e poucos anos, advogado de Joana Evangelista.
Catarina: Uma moça jovem, alegre, piedosa e bonita. Amiga de Joana.
Mulher: Uma jovem que foi à clínica fazer um aborto.
ÉPOCA
Atual.
LUGAR
Primeira cena: sala de cirurgia em uma clínica de aborto.
Demais cenas: no interior de uma delegacia de polícia em São Paulo, Brasil, a ação ocorre entre uma cela e uma sala de inquérito. Na sala de inquérito há uma mesa e duas cadeiras. Na cela, apenas uma cama de armar, um colchonete e um travesseiro, cobertos por um lençol branco. O interior da cela, porém, é um espaço que ora se amplia, ora encolhe.
A grade, móvel, delimita o espaço interno da cela: ele muda conforme a cena e a impressão de claustrofobia que se quer causar. Não há indicações no texto sobre os momentos em que o ângulo da grade deve ser amplo ou agudo. Cabe ao diretor e atores estabelecer os momentos em que a cela torna-se mais ou menos claustrofóbica.
