Se para Virgínia Woolf a criação literária feminina pressupõe um quarto isolado, apartado desses barulhos, com uma renda fixa mensal, que cuidaria da sobrevivência da autora, em Sozinha é o dobro, esse quarto ideal e essa criação artística apartada da realidade são implodidos.
Não existe um quarto para as mulheres escreverem. Nem uma renda fixa. Carolina de Jesus mostrou que a literatura contemporânea está no quarto de despejo, na rua, na miséria – nesses mil sons que fazem o cotidiano de todos nós. As vísceras e entranhas femininas estão expostas. Assim como os sonhos e desejos.
Patrícia Berton não tem 500 libras para apenas escrever ficção, e também não está desesperada e com fome, como Carolina de Jesus. Ela escreve naquele lugar mediano, dos dias cinzas, do tédio, da aparente banalidade.
No livro fica claro que os quartos ideais ficaram para os autores em torres de marfim, lidos pelos críticos, e que aprecem em revistas literárias bem comportadas.O resto de nós chafurda na lama e não consegue parar nunca de ouvir as próprias entranhas.
Joana Monteleone