A Morte Menina, de Luiz Lima Vailati
Infância e morte infantil no Brasil dos oitocentos - Rio de Janeiro e São Paulo
Morte Menina se apresenta como um daqueles trabalhos que surgem com rara assiduidade, destinados a arrebanhar elogios superlativos e leitores fiéis. A começar pelo tema difícil em torno do qual o livro foi construído, a morte infantil, assunto frente o qual, com toda a certeza, a maior parte de nós prefere fugir: de fato, a mera menção de crianças agonizantes ou mortas nos causa tal desconforto que mal podemos considerar a possibilidade de enfrentar o assunto por alguns minutos, quanto mais investir diversos anos a pesquisar uma profusão de registros fúnebres, dedicados a anotar os percalços vividos por nossos antecessores que se defrontavam com a cotidianidade da morte-menina.
Seguindo pelas fontes utilizadas que por sua fragmentação e morbidez, este tema é capaz de afastar a maior parte dos interessados. Fontes como textos eclesiásticos, que intentavam disciplinar a vivência da morte para os fiéis, tornando sua experiência, tão comum nos tempos anteriores às vacinas, aos procedimentos assépticos e aos antibióticos, suportável, ou os assentamentos de óbitos com sua profusão de mortalhas, elaboradas e coloridas, a serem envergadas pelos pequeninos falecidos, ainda compromissos de irmandades, discriminando minuciosamente os procedimentos funerais devidos aos parvos, somadas as teses médicas sobre aborto, cesariana e embriotomia.
Sem perder o rigor acadêmico, o que surge das páginas deste livro é quase uma elegia à infância de outros tempos, ameaçada pela constância da morte e vivida sob o olhar cuidadoso de adultos sobressaltados pelos perigos da perda, mas ainda assim, infância. A morte-andorinha que a acompanhava, como a denominou o poeta Álvares de Azevedo, atormentado a vida toda pela visão do corpo do irmãozinho precocemente falecido, transformada em festa para os olhos e para a memória, que podia ser, assim, relembrada para sempre. Assim o fez Luiz Vailati em Morte Menina, reconstituindo concepções, formas de viver e de morrer há muito perdidas para nós contemporâneos, cada vez mais temerosos dos registros definitivos.
Sobre o autor: Luiz Lima Vailati possui graduação em História pela Universidade de São Paulo (1997) e doutorado em História Social pela Universidade de São Paulo (2005). Atualmente é professor adjunto da Universidade Federal de Viçosa. Tem experiência na área de História, com ênfase em História do Brasil, atuando principalmente com os seguintes temas: representações, memória, morte, infância, relações familiares, imaginário político e identidades.
Sumário
Prefácio - 11
Introdução - 17
Parte I: Localizando a morte menina - 35
1. O objeto e sua trama - 39
O objeto - 39
Modelos e realidades nas cidades do Rio de Janeiro e São Paulo - 57
2. O lugar da morte infantil - 73
Mapeando a infância - 75
As idades da infância - 83
Parte II: O gestual da morte menina - 97
3. Traços gerais e primeiros cuidados - 99
Aspectos gerais - 101
Preparação para a morte - 113
Após a morte: primeiros cuidados - 127
4. A procissão, o enterro e depois - 155
O cortejo fúnebre - 157
O sepultamento - 177
Após o enterro - 199
Parte III: Discursos sobre a morte menina - 209
5. O discurso eclesiástico e leigo sobre a morte infantil - 211
O discurso eclesiástico - 213
O discurso leigo - 233
6. O discurso médico - 257
Identificação, adaptação e distanciamento frente às concepções tradicionais de morte infantil - 265
Conflito e combate às concepções tradicionais de morte infantil - 289
Conclusão - 303
Imagens - 313
Referências bibliográficas - 331
Agradecimentos - 359