O livro de Thiago Sapede trata de uma história extremamente interessante e pouco conhecida por nós, apesar de bastante estudada fora do Brasil: a do Congo, designado um reino cristão durante os quatrocentos anos nos quais se relacionou com Portugal, do final do século XV ao início do século XX. Ali formou-se uma elite que recorreu a ritos do catolicismo e laços com a Igreja Católica e a Coroa portuguesa para garantir suas posições de mando. Com grande domínio da bibliografia e com base em alguns documentos que utiliza muito bem, Thiago propõe uma interessante análise da relação entre os poderes congueses e o catolicismo ao mostrar o profundo enraizamento deste nas estruturas políticas do Congo. Na segunda metade do século XVIII, quando o trafico de escravos era principal atividade econômica na região da atual Angola, então restrita a áreas de domínio português, o Congo era uma sociedade de poder fragmentado mas que ainda se pautava por ideários associados à anterior centralização política. Àquela altura, o que mantinha a unidade entre as populações do território conhecido como reino do Congo eram em grande parte elementos simbólicos ligados ao catolicismo, como títulos e nomes cristãos, insígnias e ritos de poder de origem europeia, mesclados aos locais, como os missionários que chegaram na região na segunda metade do século XVIII, depois de muitas décadas de ausência de missionários católicos europeus, tiveram que aprender com os sacerdotes nativos quais as melhores formas de atingir a população em sua ação catequética, pois os dois séculos e meio de presença do catolicismo entre a elite conguesa era resultado em grande parte do trabalho de catequistas e sacerdotes nativos. Com esse livro, que trata de temas fascinantes e pouco conhecidos, a historiografia africanista brasileira ganha mais solidez.
Mariana de Mello e Souza
Sobre o autor: Tiago C. Sapede é historiador e trabalha com pesquisa e ensino na área de História da África. Possui graduação (bacharelado e licenciatura) em História pela Universidade de São Paulo. Cursou especialização em História da África pelo African American Studies da Universidade de Boston; é mestre em História Social pela Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo e doutorando no Institute des Mondes Africains da Ecole des hautes Études em Sciences Sociales de Paris.