Os cruzados da ordem jurídica
Referência: 9788579392047
A trajetória da OAB é apresentada ora em termos de posições e campanhas eminentemente políticas (como se fosse um partido da ordem), ora em termos de uma entidade corporativa que chegaria, com as mudanças profissionais, ao nível de um sindicato, apesar da oposição da elite fundadora. O autor afirma a escolha dos conceitos gramscianos de hegemonia, sociedade civil e Estado ampliado, que surgem naturalmente, em perfeita adequação com as questões em foco, desconsiderando a separação rígida entre teoria e análise histórica. O que está em causa é desvelar e discutir o papel de uma entidade sui generis, pois atuando na sociedade civil, tem espaço privilegiado no Estado, ao qual reivindica autonomia, ao representar e controlar o acesso à carreira dos advogados e ser de filiação compulsória. No período em foco (1945- 1964) vemos como a OAB assume a hegemonia na sociedade como uma reconhecida elite política, social e cultural, quase sempre alinhada com as demais forças “da tradição e da propriedade”, como os partidos conservadores, a Igreja Católica, os militares e a chamada “grande imprensa”. Desde a oposição ao Estado Novo até o apoio explícito ao golpe contra João Goulart, a OAB marca sua aliança explícita com a UDN (o partido da eterna vigilância) e sua facção carioca.
Um aspecto inovador desta análise se refere à “cultura institucional”, ao explicitar os critérios do Conselho Federal para sua composição. O papel da OAB é apresentado como uma missão, orientada por vínculos morais de um liberalismo elitista e excludente, pois se defende a “legalidade”, opõe-se fortemente à expansão da cidadania, da participação popular e dos direitos socioeconômicos. E mesmo em relação à defesa da categoria profissional, a Ordem atua claramente em termos de uma hierarquia de nobreza e baixo clero. O Conselho Federal, dos juristas-políticos e seus pares, compõem a nobreza e os novos advogados, com pequenos escritórios, assalariados e depois sindicalizados, são vistos pejorativamente como “mourejadores do Foro”, que trazem o risco da proletarização da carreira.