
Serenidade e Fúria
Referência: 9788577510351
Este é um livro polêmico. Seu autor possivelmente não é de brigas, porém seu estudo veio para romper barreiras, questionar o que está assentado e indicar novidades na leitura extensiva e intensiva da obra de Machado de Assis. A análise minuciosa, sensível, inteligente e cheia de achados (insights) reafirma o fôlego inesgotável de Machado e a necessidade de as gerações mais novas encontrarem o escritor e enfrentá-lo a sério.
A partir de um sobrevoo pelo sublime romântico, primeira parte do estudo, em que as grandes e complexas questões da disseminação do sublime no romantismo, europeu e, em parte brasileiro, Ravel G. Paz estabelece os parâmetros da objetividade e da subjetividade na constituição do sujeito moderno que percorrem a obra de Machado. Trata-se de observar a permanência e a inovação machadianas dessas questões desde seus primeiros poemas (visto que Machado começa sua carreira de
escritor como poeta).
Nesse quadro já começa um questionamento sólido e radical sobre as leituras estabelecidas, as quais costumam negar qualquer valor ou importância à poesia machadiana. Mas o autor demonstra a estrita consciência crítica e o projeto machadianos para alcançar sua inserção na tradição da poesia brasileira e ocidental, mesmo quando o resultado é ou parece ser canhestro e principiante. Diversos poemas do quase adolescente Machadinho (como o chamavam então) são examinados à luz daquela tradição e o leitor atual vê-se na condição difícil de ter de repensar seus lugares-comuns. Afinal, demonstra-se uma continuidade insuspeitada na obra machadiana. O “meninote” (com perdão da intimidade, que o Machado maduro jamais admitiria) já pensa grande e não está para pouca coisa. É importante destacar que, a partir dos primeiros poemas, a análise e interpretação elaboradas por Ravel G. Paz percorrem a obra machadiana,
incluindo romances e contos, estabelecendo as linhas centrais presentes nessa obra, fundamentadas na tradição filosófica e literária. Recuperam-se o peso e as implicações do sublime, tal como apropriado, reinventado e posto em ação por Machado de Assis. E aí está a inesperada novidade dessa leitura. Machado sai dela enriquecido de novas dimensões, embora longe de perder o que sobre ele já
foi dito.
As quatro partes que compõem este excepcional estudo: 1) O
Sublime Romântico: Sobrevoo; 2) A Morte, as Musas e Outros Numes; 3)
Alquimiarquiteturas Machadianas; 4) Corações e Máscaras; realizam, nas análises e interpretações postas ao alcance do leitor, uma façanha extraordinariamente bem sucedida de evidenciar a força da obra machadiana, enraizada na tradição,
modificada, deslida e ironizada, e tornada moderna e de alcance nacional e
universal. E o importante deste livro é que ele diz porque e como as coisas em Machado são o que são e como são. Trata-se, ao mesmo tempo, de um livro formativo, pedagógico, de tal maneira que nenhum leitor sai de sua leitura senão transformado, seja em si mesmo como sujeito seja na compreensão e entendimento da obra de Machado de Assis.